Quantas línguas existem mesmo?

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Levando em conta que trabalhamos em uma indústria que é inteiramente sobre idiomas, é incrível o pouco tempo que passamos realmente falando e pensando sobre idiomas propriamente ditos.

Não sobre fluxos de trabalho e automação e redução de custos e eficiências, mas apenas idiomas.  Esse fato ocorreu há alguns anos depois de uma breve conversa com uma gerente sênior de operações em uma grande prestadora de serviços de idiomas.  De alguma forma, tínhamos abordado o tema do número máximo de línguas que um determinado cliente poderia precisar e ela comentou: “Bem, provavelmente há apenas cerca de, o quê, talvez uns 200 idiomas totais em todo o mundo?”  Eu respondi que na verdade são bem mais que 6000, o que me garantiu um olhar de incredulidade e uma sobrancelha levantada que sugeriu que eu talvez estivesse batizando meu cafezinho matinal.

Então, vamos averiguar essa questão aparentemente simples sobre o número total de línguas como uma oportunidade de falar sobre os idiomas como um tópico por si só.

Para ser justo com essa gerente de operações, é muito fácil acreditar que o número de idiomas pode ser tão baixo quanto algumas centenas.  Afinal, de acordo com um estudo, 80% do poder de compra da população da Web pode ser alcançado com apenas 10 idiomas. *  Fazer isso chegar aos 90% requer apenas mais seis idiomas e 95%, apenas mais sete além disso.  Junte mais 14 e você alcançou os 99%.  Assim, com 37 das 6000 línguas diferentes do mundo, você chegou muito longe na cauda longa de idiomas, deixando as outras milhares de línguas desaparecendo em relativa obscuridade.

E quanto aos outros 6000 idiomas?

Bom, antes de tudo, é quase impossível ter certeza sobre os números.  Sua contagem depende de uma série de fatores, dentre os quais a própria definição do que constitui um idioma. Alguns critérios são bastante fáceis, por exemplo: Vivas x Mortas (por exemplo, Francês conta como um idioma em nossa contagem, mas um idioma antigo como o Latin é omitido).  Mas outros fatores são menos simples.  Por exemplo, uma das questões mais espinhosas é determinar se um certo idioma é de fato um idioma distinto por conta própria ou simplesmente um dialeto de outro idioma.  Por exemplo, você diz que o espanhol colombiano é um idioma ou um dialeto de uma linguagem genérica que chamamos de espanhol?  Acho que a maioria dos linguistas concorda a segunda noção.

E quanto a, por exemplo, Norueguês x Dinamarquês x Sueco?

Aí é um pouco mais complicado: eles são muito mais distintos um do outro do que o espanhol colombiano é do espanhol ibérico, mas, de forma muito real, eles são mutuamente inteligíveis.  Quando eu estava estudando na Noruega, por exemplo, a chance dos meus livros didáticos estarem dinamarquês era quase tão grande de estarem em sueco ou norueguês.  E há alguns dialetos do norueguês falado que eu achei mais difícil de entender do que o dinamarquês.  E, para esse assunto, mesmo no nível escrito, encontrei um dinamarquês muito menos desafiador do que a forma Nynorsk de norueguês escrito (já que eu só estudava a forma Bokmål).  Então, todas essas formas de escrita e todos esses dialetos falados são contados como línguas ou devem apenas para ser consideradas variantes de um “escandinavo” comum?  E isso, por sua vez, abre um novo ninho de cobras: a definição de linguagem pode se tornar uma questão muito pessoal e mesmo política e cultural.  Muitos noruegueses, por exemplo, podem achar que é ofensivo ouvir você dizer que seu idioma não é mais do que um dialeto de uma construção algo artificial chamada ‘Escandinávia’. **

Outro exemplo complicado é o chinês.

Dizer que o Chinês é um idioma não é nada prático, apesar do fato de que a maioria das pessoas ainda o faz. A tentação de falar sobre “chinês” como uma única língua decorre do fato de que todos os que falam variantes dela, todos escrevem em apenas duas variantes (escrita simplificada ou tradicional).  O fato de que a escrita chinesa não se trata um sistema fonético que emprega um alfabeto, torna essa armadilha complicada para os ocidentais contemplarem, porque seu raciocínio é que, se todos esses idiomas não se parecem, eles não poderiam limitar-se a apenas as duas variantes escritas.  Mas quando você parar de pensar em termos de linguagem escrita representando os sons que uma linguagem contém, logo você percebe que se pode ter muitas variantes, muitas línguas faladas diferentes representadas por uma única forma escrita.  Quando um símbolo representa uma ideia sem muita informação fonética transmitida, eu poderia usar o mesmo símbolo para ‘bicicleta’ mesmo que, nas duas línguas faladas que empreguem esta escrita, os sons que são proferidos para ‘bicicleta’ não sejam nada parecidos.  E de fato, esse é o caso: várias versões faladas do “chinês” são, de fato, mutuamente ininteligíveis, mesmo que empreguem a mesma escrita e, portanto, possam ser mutuamente inteligíveis no nível escrito, algo a ter em mente na próxima vez que você estiver tentado a dizer: “Vamos gravar algum áudio para essa escrita de chinês simplificado”.

Então começamos com o que parecia uma questão simples: quantos idiomas existem?

Mas terminamos sem uma resposta real, porque a contagem está nos olhos de quem observa.  E com isso, temos mais um exemplo da linda complexidade que é o idioma!* São eles: inglês, chinês simplificado, espanhol, japonês, alemão, francês, português, russo, árabe e coreano** E para registrar, quase todos consideram esses escandinavos como línguas separadas … e eu não recomendo debater essa noção ao compartilhar uma cerveja com um norueguês, dinamarquês ou sueco!

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